Em 11 de julho de 2022 foi publicado o Decreto nº 11.129, que regulamenta a Lei anticorrupção (Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013). O novo Decreto entra em vigor em 18 de julho de 2022 e, além de disposições que trataremos nesse texto, revoga o Decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015, que já tratava de regulamentações da Lei anticorrupção.
Relembrando, a Lei anticorrupção dispõe sobre as responsabilizações das empresas pela prática de ato lesivo contra a administração pública, nacional ou estrangeira e o Decreto nº 11.129, publicado ontem, traz a sua regulamentação, incluindo um capítulo inteiro sobre programa de integridade.
E por que o programa de integridade tem tanto destaque?
O foco da Lei anticorrupção e demais dispositivos legais que abordam o tema é o da prevenção à corrupção, suborno, fraudes e demais atos lesivos à administração pública e, consequentemente, à sociedade como um todo. Com isso, programas de integridade seriamente implementados têm um papel importante para o atingimento desse objetivo preventivo.
Já no início do Decreto, em seu Art.6º, que trata da avaliação de fatos e circunstâncias conhecidos na instauração de Processo Administrativo de Responsabilização (PAR), a comissão responsável pelo caso deverá intimar a pessoa jurídica que praticou ato lesivo a apresentar sua defesa e
“…
II – solicitará a apresentação de informações e documentos, nos termos estabelecidos pela Controladoria-Geralda União, que permitam a análise do programa de integridade da pessoa jurídica.”
Caso a empresa apresente em sua defesa informações e documentos referentes à existência e ao funcionamento de programa de integridade, a comissão processante deverá examiná-lo segundo os parâmetros indicados no Capítulo V (que trata especificamente dos programas de integridade), para a dosimetria das sanções a serem aplicadas. Aqui, destaca-se que, um bom programa de integridade, comprovadamente implementado, pode atenuar a pena aplicada – em até 5% do valor previamente estipulado.
Contudo, conforme o artigo 23 do Decreto, o plano de integridade apresentado deve ter tido sua implantação anterior à prática do ato lesivo!
Ainda é posto que não basta adotar e implementar um programa de integridade. Após o ato lesivo ser confirmado, pode ser exigido seu monitoramento para confirmação de seu aperfeiçoamento, que pode se dar por “(…) análise de relatórios, documentos e informações fornecidos pela pessoa jurídica, obtidos de forma independente ou por meio de reuniões, entrevistas, testes de sistemas e de conformidade com as políticas e visitas técnicas”, como disposto no artigo 51. Contudo, microempresas e empresas de pequeno porte poderão ter a avaliação de seu programa de integridade sob avaliação simplificada, conforme o artigo 67.
E o que diz o novo Decreto especificamente sobre programas de integridades?
No Capítulo V, dedicado aos Programas de Integridade, o Decreto nº 11.129 define que o programa de integridade no âmbito de uma pessoa jurídica, consiste no “conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes.” com objetivo de:
“I – prevenir, detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira; e
II – fomentar e manter uma cultura de integridade no ambiente organizacional.”
Merecendo atenção especial, nesse artigo 56, o
“Parágrafo único. O programa de integridade deve ser estruturado, aplicado e atualizado de acordo com as características e os riscos atuais das atividades de cada pessoa jurídica, a qual, por sua vez, deve garantir o constante aprimoramento e a adaptação do referido programa, visando garantir sua efetividade.”
Ou seja, exatamente como destacamos no nosso blog nos artigos “Código de Ética não funciona com copia e cola” e “Conceitos básicos de compliance que toda empresa precisa saber”.
Quanto aos parâmetros de avaliação do programa de integridade na aplicação de sanções, trazemos abaixo na íntegra o que o novo Decreto dispõe, demonstrando item a item dos temas e relevância destes em um bom programa de integridade:
I – comprometimento da alta direção da pessoa jurídica, incluídos os conselhos, evidenciado pelo apoio visível e inequívoco ao programa, bem como pela destinação de recursos adequados;
II – padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de integridade, aplicáveis a todos os empregados e administradores, independentemente do cargo ou da função exercida;
III – padrões de conduta, código de ética e políticas de integridade estendidas, quando necessário, a terceiros, tais como fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados;
IV – treinamentos e ações de comunicação periódicos sobre o programa de integridade;
V – gestão adequada de riscos, incluindo sua análise e reavaliação periódica, para a realização de adaptações necessárias ao programa de integridade e a alocação eficiente de recursos;
VI – registros contábeis que reflitam de forma completa e precisa as transações da pessoa jurídica;
VII – controles internos que assegurem a pronta elaboração e a confiabilidade de relatórios e demonstrações financeiras da pessoa jurídica;
VIII – procedimentos específicos para prevenir fraudes e ilícitos no âmbito de processos licitatórios, na execução de contratos administrativos ou em qualquer interação com o setor público, ainda que intermediada por terceiros, como pagamento de tributos, sujeição a fiscalizações ou obtenção de autorizações, licenças, permissões e certidões;
IX – independência, estrutura e autoridade da instância interna responsável pela aplicação do programa de integridade e pela fiscalização de seu cumprimento;
X – canais de denúncia de irregularidades, abertos e amplamente divulgados a funcionários e terceiros, e mecanismos destinados ao tratamento das denúncias e à proteção de denunciantes de boa-fé;
XI – medidas disciplinares em caso de violação do programa de integridade;
XII – procedimentos que assegurem a pronta interrupção de irregularidades ou infrações detectadas e a tempestiva remediação dos danos gerados;
XIII – diligências apropriadas, baseadas em risco, para:
a) contratação e, conforme o caso, supervisão de terceiros, tais como fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários, despachantes, consultores, representantes comerciais e associados;
b) contratação e, conforme o caso, supervisão de pessoas expostas politicamente, bem como de seus familiares, estreitos colaboradores e pessoas jurídicas de que participem; e
c) realização e supervisão de patrocínios e doações;
XIV – verificação, durante os processos de fusões, aquisições e reestruturações societárias, do cometimento de irregularidades ou ilícitos ou da existência de vulnerabilidades nas pessoas jurídicas envolvidas; e
XV – monitoramento contínuo do programa de integridade visando ao seu aperfeiçoamento na prevenção, na detecção e no combate à ocorrência dos atos lesivos previstos no art. 5º da Lei nº 12.846, de 2013.
§ 1º Na avaliação dos parâmetros de que trata o caput, serão considerados o porte e as especificidades da pessoa jurídica, por meio de aspectos como:
I – a quantidade de funcionários, empregados e colaboradores;
II – o faturamento, levando ainda em consideração o fato de ser qualificada como microempresa ou empresa de pequeno porte;
III – a estrutura de governança corporativa e a complexidade de unidades internas, tais como departamentos, diretorias ou setores, ou da estruturação de grupo econômico;
IV – a utilização de agentes intermediários, como consultores ou representantes comerciais;
V – o setor do mercado em que atua;
VI – os países em que atua, direta ou indiretamente;
VII – o grau de interação com o setor público e a importância de contratações, investimentos e subsídios públicos, autorizações, licenças e permissões governamentais em suas operações; e
VIII – a quantidade e a localização das pessoas jurídicas que integram o grupo econômico.
§ 2º A efetividade do programa de integridade em relação ao ato lesivo objeto de apuração será considerada para fins da avaliação de que trata o caput.
Adicionalmente, o Decreto nº 11.129 traz um capítulo sobre acordos de leniência, que são atos administrativos de negociação, que buscam, através da cooperação pela pessoa jurídica que cometeu o ato lesivo, a identificação de demais envolvidos, quando couber, obtenção de informações e documentos que comprovem a infração sob apuração e a reparação do dano causado.
Como reparação ao dano nos acordos de leniência, o decreto traz novamente a importância dos programas de integridade em seu artigo 45:
Art. 45. O acordo de leniência conterá, entre outras disposições, cláusulas que versem sobre:
(…)
IV – a adoção, a aplicação ou o aperfeiçoamento de programa de integridade, conforme os parâmetros estabelecidos no Capítulo V, bem como o prazo e as condições de monitoramento;
Para o conhecimento integral do novo Decreto você pode acessá-lo no site oficial do Governo Federal nesse link.
Link acessado em 12/07/2022.